A análise econômica do
proibicionismo se concentra nas consequências não intencionais das proibições,
contrárias à intenção de seus defensores. As causas do fenômeno, por sua vez,
são atribuídas a fatores psicológicos, como os instintos que levam alguns a tentar
impor valores aos outros, mesmo nos casos nos quais a ação proibida não gera
danos a terceiros.
Mas será que existiriam
causas econômicas?
Além de sua origem
instintiva, existe um aspecto econômico que ajuda a explicar a expansão do
proibicionismo. Como será demonstrado a
seguir, a ênfase dos governantes em projetos que proíbem ou restringem algum
comportamento individual dos governados faz parte de uma estratégia racional de
sobrevivência política de baixo custo em estados altamente endividados — os
quais sofrem resistência, por parte da sociedade, ao financiamento da expansão
de seus gastos.
A exposição do argumento
requer o exame dos incentivos e restrições enfrentadas pelos políticos. Estes
últimos operam em um ambiente que mostra tendência à expansão de sua influência
e tamanho.
Iniciemos com a revisão dos
dois motivos básicos por trás das falhas de governo, que ironicamente
fundamentam essa expansão do estado.
Em primeiro lugar, os
governos falham porque seus agentes não são tão inteligentes quanto se supõe.
Em termos gerais, a substituição do mecanismo descentralizado dos mercados pela
ação estatal centralizada implica, dado o pressuposto de conhecimento limitado
por parte de qualquer grupo de agentes, a redução da capacidade de se levar em
conta nas regulações e projetos as informações dispersas sobre os detalhes do
infinitamente complexo ambiente econômico.
Isso se manifesta por meio das
consequências não intencionais do plano central, contrárias aos objetivos de
seus idealizadores. Concretamente, isso significa que intervencionismo gera
empobrecimento.
Em decorrência da ignorância
da teoria econômica, esse empobrecimento tem um efeito curioso, que poderíamos
denominar Lei de Say do Intervencionismo: as falhas de governo geram sua
própria demanda. Os problemas gerados pelo insucesso das intervenções prévias
são atribuídos a mercados pretensamente desregulados, o que acaba gerando
pressão por novas medidas corretivas da mesma natureza daquelas que causaram o
problema inicial. Quanto pior o desempenho de uma solução estatal, mais verba é
exigida para tornar mais "eficaz" essa mesma solução.
Em segundo lugar, os
governos falham porque seus agentes não são tão altruístas quanto se supõe. Se
adotarmos a hipótese aparentemente escandalosa de que políticos gostam de poder
e funcionários públicos de dinheiro, o estado interventor irá ofertar
privilégios legais que conferem poderes monopolistas a empresas estabelecidas,
que por sua vez usarão parte do ganho de monopólio pilhado do consumidor para pagar
impostos e financiar campanhas políticas.
Como os eleitores não têm
como monitorar de perto o comportamento dos políticos e cada privilégio legal
conferido pelo estado gera ganhos concentrados para poucos e custos pagos por
todos, existem condições para que na esfera política minorias façam lobby, obtenham vantagens monopolistas e
efetivamente explorem a maioria da população.
As duas fontes de falhas de
governo interagem para a expansão do setor estatal.
Intervenções mal sucedidas
geram demanda por mais intervenções, que exigem transferência de recursos para
o setor púbico, que se cristalizam na forma de poder para políticos, salários
para funcionários públicos, ganhos para firmas associadas e, em geral, migração
de esforços da atividade de produção (competição nos mercados) para a atividade
de 'predação' (competição na arena política).
A consequente perda de
dinamismo da economia, como em uma bola de neve, convida então a mais poder
conferido aos políticos.
Esse mecanismo de expansão
do estado exige cada vez mais do setor produtivo. Como se trata efetivamente de
um modelo de exploração, a analogia com o parasitismo é apropriada. O parasita
se expande à custa do hospedeiro até o limite imposto pela debilitação
demasiada deste, que ameaça o futuro do parasita. O nosso hospedeiro, o setor
produtivo, tende a criar mecanismos de defesa contra as investidas do parasita
em expansão.
Financiamento monetário gera
defesas, como ajustes nas expectativas sobre aumentos de preços e indexação;
endividamento prolongado exige juros cada vez maiores para novos empréstimos e
aumentos de carga tributária geram custos políticos. Em equilíbrio, a
resistência marginal a cada fonte de transferência para o setor público deve
ser igual, a menos que surjam oportunidades de exploração geradas por mudanças
em alguma circunstância relevante, criando oportunidades para o
empreendedorismo político.
Portanto, em um cenário no
qual as extrações por meio de inflação, endividamento e tributação já atingiram
patamares que envolvem resistências consideráveis, o político se encontra em um
cenário aparentemente sem alternativas. Para sobreviver no curto prazo (a
competição política puniria impiedosamente quem pensa no longo prazo), o
político tem de deixar sua marca.
Mas como encontrar recursos
para a construção de um novo elefante branco que sirva como vitrine? Afinal, as
gestões anteriores já dilapidaram os recursos públicos passados e futuros em
obras caríssimas e investimentos sem sentido, deixando como subprodutos
privilégios, burocracia e cabides de emprego. A população, por sua vez, reclama
de falta de líderes como os do passado, ignorando que foram as ações destes
últimos que amarraram as mãos de seus herdeiros.
Uma solução racional de
baixo custo para o político é dada pelo proibicionismo: a imposição de normas
que proíbem ou restringem algum tipo de comportamento dos governados. Já que
não existem novos recursos públicos para serem gastos diretamente, então que os
custos das "realizações políticas" de um governante sejam pagos pelos outros,
em uma nova modalidade de extração de recursos.
Para que essa solução seja
viável, precisamos investigar sua demanda. Com certeza, apela aos instintos
básicos da população: quantas vezes, diante da existência de algum problema,
ouvimos alguém afirmar que deveria existir alguma lei proibindo diretamente
algum comportamento que se crê ser a sua causa? Ao contrário do economista, que
examina consequências não intencionais e investiga, além dos benefícios, também
os custos de cada decisão, a opinião de senso comum percebe apenas boas ou más
intenções por parte das pessoas, passíveis de correção por parte do estado paternalista.
No ambiente político
contemporâneo, marcado pela ausência de respeito pela diversidade de opiniões
em favor da divisão totalitária e moralizante entre as posições dos
esclarecidos e dos ignorantes, o proibicionismo ressoa fundo naquele que
acredita que o mundo seria um lugar melhor se os outros seguissem o seu próprio
exemplo, modelo de virtude politicamente correta.
Mas, para que de fato
funcione, o proibicionismo deve impor custos preferencialmente aos outros, como
ocorre em qualquer modalidade de escolha política. Como dizia Mussum, "O governo tá certis!",
desde que a política não afete o preço da cachaça. Como a adoção de padrão esdrúxulo de tomada
elétrica afeta a todos, a proibição é quase universalmente detestada e não
gera dividendos políticos por parte da demanda.
As proibições de jogos
eletrônicos de tiros, venda de brinquedos associados a alimentos, armas de
brinquedo, sacolas plásticas em supermercados ou de álcool não diluído em água,
por outro lado, como afetam grupo mais restrito de pessoas, têm apelo maior.
O mesmo ocorre com a redução
artificial de limites de velocidade, pretensamente em nome da segurança, que
extrai dos motoristas os altos lucros da indústria das multas.
A assimetria de imposição de
custos explica assim o surgimento de propostas fantásticas como aquela que
propõe limitar a 30 Km/h a velocidade de veículos em todas as ruas de certos
bairros. Maurício de Souza pode ficar bravo, com razão, com a ideia de proibir
as maçãs da Mônica, mas quais
consumidores se importariam a ponto de se organizar politicamente para bloquear
a iniciativa?
Naturalmente, quanto mais
alto for o custo imposto a um grupo, maior será a resistência. Isso nos leva ao
exame do aspecto ideológico do problema. A eficácia do proibicionismo pode ser
reforçada por fatores ideológicos se a resistência por parte daqueles que arcam
com as consequências da proibição for distorcida pelo discurso governista,
apresentada como se fosse manifestação reacionária de alguma classe de vilões.
Se a criação de classes
imaginárias puder coincidir com alguma divisão entre uma postura moral correta
e outra condenável, o ganho político é potencializado, angariando simpatia até
mesmo daquelas pessoas cheias de remorsos, que se enxergam como membros da
fictícia classe vilã!
Essa manobra, porém, tende a
surtir efeito apenas junto aos intelectuais, já que as classes propostas nas
explicações dos políticos existem apenas na imaginação, enquanto a população do
mundo real sofre as consequências da verdadeira exploração entre classes:
aquela imposta pelos monopólios concedidos pelos políticos aos seus clientes.
O contraste entre os dois
tipos de teoria de exploração e a lógica do proibicionismo pode ser ilustrado
pelas recentes administrações municipais de São Paulo. Castigada ao longo do
tempo por prefeitos que legaram aos paulistanos uma cidade endividada, com
excesso de funcionários, altos impostos e serviços públicos de péssima
qualidade, São Paulo preenche as condições iniciais descritas pela nossa
análise.
Durante a gestão Kassab, a
despeito do significativo aumento do IPTU, não se pôde perceber melhora na
qualidade dos serviços prestados pela prefeitura. Em cenário no qual não se
cogita reformas liberalizantes e a situação fiscal não permite obras de impacto
no curto prazo, a alternativa que restou para fugir de uma má avaliação por
parte dos eleitores foi o proibicionismo. A realização que marcou tal gestão
foi a "lei da cidade
limpa", que proibiu a atividade de publicidade externa privada na cidade e
impôs reformas nas fachadas dos estabelecimentos comerciais, em nome de valores
estéticos.
Admitindo para fins de
argumentação a legitimidade desse tipo de intervenção, a valorização de
fachadas em áreas de interesse histórico e eventuais abusos de publicidade
poderiam ser tratados por aplicação da legislação prévia, mas o proibicionismo
mais contundente gerou o efeito político desejado, a um custo irrisório para a
prefeitura: a maioria da população apoiou entusiasticamente a medida e os
custos foram transferidos para uma minoria de lojistas e de pessoas associadas
ao mercado de publicidade externa. Além disso, a prefeitura garantiu para si o
monopólio do segmento.
Na gestão Haddad, o primeiro
impulso foi buscar novos aumentos do IPTU para financiar mais "soluções" para
os problemas do município, deixando intocadas as ineficiências existentes que
sorvem o enorme orçamento público municipal. Barrada essa tentativa de aumento de
impostos, restou ao prefeito novamente deixar sua marca através do
proibicionismo, desta vez no setor de transportes: faixas exclusivas para
ônibus e bicicletas.
Por um custo irrisório para
a prefeitura, os motoristas gastam algumas horas a mais por semana se
deslocando pela cidade para abrir espaço para faixas completamente vazias de
ônibus e bicicletas. Além do apoio a essas iniciativas, a prefeitura espera
aumento significativo de arrecadação com a fiscalização eletrônica de violações
dessas proibições.
Mas, como neste caso os
custos incorridos pela população são consideráveis, piorando o que talvez seja
a principal desvantagem de viver na cidade, a reação negativa foi considerável,
o que requer considerável investimento ideológico para reverter a avaliação
negativa do prefeito.
Os argumentos utilizados
para desacreditar os críticos utilizaram um dos maiores talentos dos políticos,
a saber: a exploração dos instintos tribais da população por meio da sugestão
de divisão da sociedade entre classes antagônicas. Afinal, intelectual odeia
riqueza, motoristas detestam motoboys
e pedestres não gostam de ciclistas.
Muitos argumentos empregados
invocaram lutas de classes entre ricos proprietários de automóveis e pobres
usuários de ônibus e bicicleta ou ainda o confronto moral entre motoristas sem
consciência ecológica e usuários das demais modalidades, possuidores dessa
consciência. A resistência é atribuída, por exemplo, à elite "coxinha" do
bairro de Higienópolis: dondocas consumistas não estariam dispostas a perder
algumas vagas de estacionamento para dar passagem a ciclistas, ocupados em
salvar o planeta.
A manipulação ideológica
desses "conflitos de classe" varia conforme a necessidade do momento. Na URSS,
sob o peso dos fracassos do planejamento, a classe conspiradora dos grandes
proprietários de terra (kulaks) foi
ampliada até finalmente incluir o agricultor com apenas uma vaca. Em São Paulo, a vítima
social favorita na gestão Suplicy, o motoboy,
é agora ignorado e substituído pelo ciclista, conforme as antigas faixas de
motos são convertidas em ciclovias.
A demonização de opositores
nesse processo nos oferece a oportunidade de contrastar as fantasiosas
concepções sobre lutas de classe utilizadas pelos demagogos com a teoria da
exploração relevante, esboçada no início deste artigo. Enquanto alguns
fantasiam sobre seu bom-mocismo, a maioria padece parado no trânsito ou no
ponto de ônibus e o pobre se endivida para comprar motos para fugir do péssimo
sistema de transporte público.
Por que não são realizadas
então mudanças significativas no setor de transportes urbanos, sistematicamente
mal avaliado pela população? Por que a regulação não induz competição e
eficiência? O profissional do ramo consulta os manuais de microeconomia, em
busca de uma racionalização para a regulação existente: o transporte seria um
monopólio natural, as ruas são bens públicos, existiriam externalidades
significativas no ramo, que seria repleto de assimetrias de informação. Essas
fontes de falha de mercado justificariam a regulação vigente.
O cético, pelo contrário,
acredita que a perene má qualidade do transporte é explicada por regulação que
obedece a lógica da aliança entre políticos e empresários: estes últimos obtêm
receitas em ambiente livre de pressões competitivas em troca de, entre outras
coisas, financiamento de campanha dos primeiros. O ônus político gerado pela
transferência de recursos dos passageiros para as firmas do setor pode ser
diminuído por congelamento de tarifas acompanhado de transferência indireta via
subsídios cada vez maiores, como em São Paulo.
A existência de faixas
exclusivas vazias ilustra perfeitamente as "contradições internas" da política
de transportes: ceteris paribus,
cartéis não têm interesse em expandir a oferta de um serviço, a menos que
consigam dificultar a oferta das modalidades rivais, fora do cartel.
Esta explicação "cínica"
para a má qualidade do serviço de transporte, infelizmente, não pode ser
ilustrada diretamente, pois acordos de exploração política, pela sua própria
natureza, nunca são públicos. O setor, de fato, apresenta a falta de
transparência típica da atividade governamental. Mas a natureza anticompetitiva
da regulação é indiretamente revelada o tempo todo.
Considere, por exemplo, a
regulação dos perueiros na gestão Suplicy. A proibição da atuação de perueiros
independentes ocorreu precisamente no momento em que estes, atuando de forma
competitiva, se recusaram a acompanhar o aumento de tarifas do serviço prestado
pelas companhias de ônibus. No novo sistema, esse resquício de competição foi eliminado
pela substituição das vans independentes por cooperativas integradas ao esquema
de divisão do mercado entre as firmas do setor.
Fica ao leitor a tarefa de
estudar, na seção policial dos jornais, os laços entre partidos políticos,
vereadores, companhias de ônibus, sindicatos, cooperativas e crime organizado
que marcam a gestão do segmento desde então.
Considere ainda a rapidez
com a qual são bloqueados em diversos locais do mundo os avanços tecnológicos, como os aplicativos de
carona, que ameaçam os privilégios monopolísticos conferidos pela regulação
da atividade de taxista. A exploração via regulação não apenas protege os
interesses dos ofertantes estabelecidos, como impede que ocorra o processo de
descoberta de novas formas de atender as necessidades da população. Os
analistas da área de fato julgam inconcebível a existência de arranjos
diferentes daqueles vigentes.
Isso nos leva ao contraste
entre as soluções que seriam trazidas pela inventividade resultante da
competição e as soluções dos burocratas, que pateticamente nos oferecem como
opção um mar de bicicletas, como se estivéssemos em alguma cidade pobre da
China de algumas décadas atrás.
Restrito pela falta de
confiança no poder inventivo de homens livres e pelo medo de perda de apoio das
demais pessoas que lucram com os esquemas vigentes de exploração da população,
o político moderno é profundamente conservador, no sentido de que não cogita em
absoluto alterar a lógica desse mecanismo de exploração.
Na impossibilidade de
alimentá-lo ainda mais, resta a alternativa de proibir paternalisticamente
algum tipo de comportamento. Aguardemos para descobrir qual será a proibição
preferida pelo próximo prefeito.