Educa a
criança no caminho em que deve andar; e até quando envelhecer não se desviará
dele. Provérbios 22:6
Como
criar métodos para iniciar os jovens no ensino da ciência econômica? Isso é de suma importância, pois, afinal, a próxima
geração é a que conta.
Tentar
ensinar economia para adultos já é difícil o bastante, dado que é um tanto raro
encontrar adultos que tenham genuíno interesse ou aptidão para o assunto. No máximo,
há adultos com inclinações partidárias e ideológicas, mas não com genuíno interesse
pela ciência econômica.
Será
que existe alguma maneira de apresentar ideias tão complexas a crianças, de modo
que elas se sintam compelidas a ter um comportamento social condizente com o
livre mercado? Talvez. Mas antes vamos refletir sobre nossa
matéria-prima: as crianças a quem ensinaríamos.
Há
aquelas pessoas que afirmam que cada bebê inicia a vida como um pequeno
selvagem; que ele está dotado, entre outras coisas, de órgãos e músculos sobre
os quais não tem controle, com um instinto de autopreservação, com emoções e
impulsos agressivos como a raiva, o medo, e o amor, sobre os quais ele tampouco
possui qualquer controle, e que durante o processo do crescimento é normal para
uma criança se sujar, brigar, responder, desobedecer, se esquivar. "Toda criança deve crescer e ao mesmo tempo
se livrar do comportamento delinquente". Assim é o argumento.
De
minha parte, não me sinto confortável com essa visão freudiana da gênese da
raça humana. Preferiria muito mais pensar em uma criança como um broto de
planta, com todo o potencial para a beleza e a felicidade que um organismo em
crescimento prenuncia. É claro que em cada caso específico, do ponto de vista
de um adulto, poderá haver uma aparente desorganização, uma falta de
coordenação, e uma desarmonia. Mesmo que seja assim, o potencial para a beleza
e a harmonia está lá.
Seja
a criança considerada um bárbaro selvagem ou uma beldade em germinação, o
desafio está em fazê-la sair de um estado de ignorância quanto às suas relações
com os outros, e ascender para um estado de harmonia com as leis universais que
governam a condição humana. A criança é uma extensão da responsabilidade dos
pais, e essa responsabilidade inclui colocá-la na direção de um sólido
entendimento econômico. Eis algumas possibilidades:
Se derrubar algo, pegue.
Isso
é fácil de ser ensinado, especialmente para os pais que seguem essa máxima eles
próprios. Trata-se de um treinamento
básico sobre assumir a responsabilidade pelos próprios atos — ou seja, não
prejudicar terceiros com o próprio comportamento.
Uma
criança que adota esse comportamento desde cedo está dando seus primeiros
passos em direção ao autocontrole. E,
caso esse comportamento se torne um hábito, ela provavelmente irá, ao atingir a
maturidade, recorrer a si mesma, e não aos outros, para se resgatar a si
própria de dificuldades econômicas criadas por seus próprios erros.
Muito
provavelmente, ela não será um fardo para a sociedade.
O
indivíduo que possui um genuíno domínio sobre seu autocontrole tende a desenvolver
uma capacidade rara e valiosa: a habilidade de determinar as próprias ações.
Uma pessoa assim não se sentirá tentada a mudar bovinamente de posição apenas
para ser mais um no meio da massa. Ela não
cederá por conta de pressões, de opiniões volúveis, de sabedorias populares
etc. Ela irá se tornar seu próprio mestre.
Pegar
o que você deixou cair ajuda a organizar sua mente. Ao se transformar em algo instintivo, torna-se
um hábito jubiloso, levando você eventualmente a pegar coisas que outros
deixaram cair. Projetado na vida adulta,
isso mostra uma atitude caridosa, no sentido judaico-cristão: o dever
moral de uma pessoa para com os menos afortunados.
Se abrir uma porta,
feche-a.
Esta
é uma sequência da lição anterior; trata-se meramente de uma prática que
confirma a sabedoria de se completar cada transação em sua vida.
Um inevitável dualismo
divide a natureza, de maneira que cada coisa é uma metade, supondo alguma outra
coisa que a complete; espírito e matéria, homem e mulher, subjetivo e objetivo,
dentro e fora, em cima e embaixo, movimento e repouso, sim e não.[1]
Para
ensinar crianças eu acrescentaria isso: derrubar, apanhar; abrir, fechar; e
outras.
Se fizer uma promessa,
mantenha-a.
Não
há melhor aliado para o caos social do que promessas não cumpridas.
Crianças
que não tenham sido educadas para manter a palavra dada serão autoras de tratados
feitos para não serem seguidos; elas concorrerão a cargos políticos ou executivos fazendo
falsas promessas, cancelarão contratos, e utilizarão meios políticos para
expropriar propriedade alheia; elas venderão suas almas em troca de fama,
fortuna e poder.
Elas
não apenas fracassarão em serem honestas com seus companheiros, como também não
darão atenção nem mesmo às ordens de suas próprias consciências.
Por
outro lado, crianças educadas a manterem suas promessas não fugirão de suas
obrigações, chova ou faça sol. A integridade será a sua marca de distinção.
O que quer que você
tenha pegado emprestado, devolva.
Essa
é uma extensão da lição sobre manter a promessa.
A
adesão a esses conselhos desenvolve o respeito pela propriedade privada, que é
uma premissa fundamental para a doutrina econômica sólida.
Nenhuma
pessoa criada dessa forma pensaria em construir seu ninho à custa dos ninhos de
outros. Estatistas adeptos do
assistencialismo e entusiastas do planejamento centralizado não surgem se
houver esse tipo de treinamento.
É
verdade que um socialista pode honrar uma dívida contraída em seu próprio nome,
mas o fato é que ele desconsiderará qualquer endividamento feito em nome "do
povo" ou do bem comum. Ele não foi
educado para entender que o princípio da compensação se aplica a todo e
qualquer caso.
Jogue o "jogo do obrigado".
Essa
lição levará um pai brilhante e uma criança esperta a qualquer lugar.
É
possível enunciar a ideia, mas não há como ensiná-la. Uma vez compreendida, a
ideia é bastante simples, embora tão evasiva que, apesar dos 33.000 anos
passados desde o homem de
Cro-Magnon, ela só foi descoberta há pouco mais de um século: o valor de um
bem ou serviço não é determinado objetivamente
pelo custo de produção, mas sim subjetivamente
pelo que outras pessoas estão dispostas voluntariamente a dar em troca deste
bem ou serviço.
Não
há conceito mais importante do que esse na ciência econômica: o livre mercado
não tem outra origem econômica que não esta teoria de valor subjetivo ou de
utilidade marginal. Com efeito, ela é
mais precisamente definida como a teoria do valor-mercado.
Exemplo:
quando uma mãe troca R$ 1,00 por um kg de arroz, ela valoriza mais o arroz do
que o R$ 1,00 e o vendedor dá mais valor ao R$ 1,00 do que ao quilo de arroz.
Se a mãe valorizasse mais o R$ 1,00 do que o arroz, ela não faria a troca. Se o
vendedor valorizasse mais o arroz do que o R$ 1,00, ele não faria a troca. Os
valores do arroz e do R$ 1,00 (excluindo qualquer outra consideração) são
determinados por duas opiniões subjetivas.
A
quantidade de trabalho empregada (custo) na obtenção do R$ 1,00 ou na aquisição
do arroz não tem nenhuma relação com
o valor do R$ 1,00 ou do arroz.
Repetindo:
o valor de qualquer bem ou serviço é determinado pelo que será dado por ele em
uma troca voluntária, e nunca forçada ou
involuntária.[2]
Quando o R$ 1,00 é trocado pelo arroz, o vendedor conclui a transação dizendo
"Obrigado", já que em sua opinião ele teve um ganho. Esse é o mesmo motivo pelo
qual a mãe diz "Obrigada", já que ela também obteve um ganho, na sua própria
opinião. Não seria nada impróprio descrever isso como o "estilo grato da vida
econômica".
Esse
conceito de valor, é bom lembrar, tem sido praticado pelo homem comum milênios
antes de os teóricos econômicos o identificarem como o meio mais eficaz de se
avançar mutuamente no bem-estar econômico. E, justamente por isso, a criança pode ser
ensinada a praticá-lo antes mesmo de ela ter condições de entender o básico da
teoria.
Ao
trocar brinquedos ou bolinhas de gude ou figurinhas ou o que quer seja entre
si, crianças podem perfeitamente jogar o "jogo do obrigado". Elas podem ser ensinadas a expressar o mesmo "obrigado"
que esperam receber de seus amigos. Se isso
não ocorrer é porque houve algo de errado com a troca. Por outro lado, quando ao final da transação dizem
"obrigado", é porque todos saíram ganhando.
Obtenha
essa atitude de um menino ou de uma menina e você terá plantado a semente do
pensamento econômico sólido.
Não faça a um amigo o
que você não gostaria que ele fizesse a você.
A
filosofia moral é o estudo e a investigação sobre o certo e o errado. Já a ciência
econômica é um ramo dessa disciplina: o estudo do certo e do errado em assuntos
econômicos.
Sendo
assim, o livre mercado é simplesmente a aplicação da filosofia moral à ciência
econômica — a economia de livre mercado, portanto, depende da prática da Regra de Ouro
(a ética da reciprocidade).
É
duvidoso que a Regra de Ouro possa ser descrita e ensinada de modo a ser
completamente apreendida antes da adolescência. Sua apreensão requer uma
natureza moral, faculdade raramente adquirida antes da juventude — e, em
alguns casos, nunca.
Mas
o esforço para se ensinar a Regra de Ouro a meninas e meninos irá resultar, no
mínimo, em uma melhor observação dessa regra por parte dos pais. Crianças —
altamente impressionáveis — são guiadas muito mais pela conduta dos pais do
que por suas reprimendas; elas são guiadas muito mais pela observação de
exemplos do que pelo mero ensino verbal.
Assim,
a tentativa de se ensinar esse princípio fundamental de moralidade e justiça, resultando em um comportamento altamente
exemplar, pode levar a criança primeiro à imitação, e depois à observância
e à prática rotineiras.
Ambos os genitores são os
responsáveis pelas gerações vindouras, e são também eles os responsáveis por
escolher os tipos de pessoas que ajudarão a educar e a ensinar seus filhos.
[1]
Extraído de Compensation de Ralph Waldo
Emerson
[2]
Impostos, subsídios, tarifas de importação são exemplos de trocas forçadas.