quarta-feira, 27 mar 2013
Em
2011, quando foi dada a notícia de que o Brasil havia ultrapassado o Reino
Unido em termos do Produto Interno Bruto (PIB), a euforia foi grande. Para o governo brasileiro, este evento foi interpretado
como consequência de sua própria política econômica e como um prognóstico de
que em pouco tempo o Brasil iria ultrapassar também as outras grandes economias
e encostar na China e nos Estados Unidos. Exatamente por isso, foi grande a decepção
quando, pouco tempo depois, a economia brasileira se estagnou e perdeu — na
verdade, devolveu — para o Reino Unido o sexto lugar no ranking das maiores
economia do mundo.
A
pergunta que agora se faz é: o forte crescimento da economia brasileira nos
anos anteriores a 2011 representou um sinal de um novo padrão de crescimento
econômico para o Brasil ou será que toda aquela bonança econômica foi apenas um ponto
fora da curva? No primeiro cenário, o fraco
crescimento econômico atual seria apenas algo temporário, de modo que o Brasil
voltará em breve a crescer novamente. Porém,
uma análise mais profunda do desempenho econômico do Brasil aponta para o
segundo cenário: o fraco crescimento econômico atual sinaliza um retorno ao padrão
antigo, com longas estagnações.
Porém,
dado que o governo atual vai fazer todo o possível para voltar a apresentar
altas taxas de crescimento econômico, é de se esperar uma intensa aplicação de
todo o arsenal de políticas macroeconômicas com o intuito de se fabricar um crescimento
artificial. A consequência disso é que o
alívio temporário será pago com uma debilidade econômica ainda maior no
futuro.
Crescimento fraco
Desde
2011, a economia brasileira entrou numa fase de debilidade, com uma rápida
queda das taxas do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do país (veja
figura 1).

Figura 1: Taxas de
crescimento do PIB 2010 - 2012 (Trimestre sobre mesmo trimestre do ano anterior
Como
se pode observar no seguinte gráfico (figura 2), depois da crise cambial de 1999,
o Brasil experimentou uma fase de produção abaixo da trajetória de longo prazo,
fase esta que foi seguida por uma forte recuperação de 2004 até 2010, a qual
empurrou o produto interno bruto brasileiro para cima da tendência do PIB de
longo prazo.

Figura 2 - PIB em bilhões de dólares 1980-2012
Porém,
durante essa fase de forte crescimento econômico do PIB, a taxa do crescimento
da produção industrial permaneceu fraca.

Figura 3 — Taxas anuais
do crescimento da produção industrial 1995-2012
No
setor industrial, a taxa de crescimento se tornou negativa em 2012, gerando
preocupações quanto a uma onda de "desindustrialização". No entanto, a fraqueza do setor industrial
brasileiro não é de modo algum algo novo. Com uma taxa média de crescimento anual de apenas
2,6 % desde o começo dos anos 1990, o Brasil nunca chegou a completar o
processo de industrialização.
O
conjunto dos dados (figuras 1-3) fortalece a tese de que a atual fraqueza do
crescimento da economia brasileira sinaliza um retorno à sua tendência
histórica. Dado que a debilidade da
produção industrial não mudou e continua fraca, foram fatores temporários que atuaram
para gerar o crescimento econômico acima de sua trajetória nos anos de 2004 até
2010.
Como
a capacidade produtiva do Brasil não aumentou de forma sustentável, as baixas
taxas de crescimento econômico vivenciadas desde 2011 indicam um retorno a uma
trajetória de crescimento mais baixa do que a da última década. Este retorno pode acontecer em tempo mais
curto, na forma de uma forte recessão, ou em um período de tempo mais
prolongado, configurando uma estagnação.
Uma breve bonança
A
boa conjuntura que o Brasil vivenciou de 2004 até 2010 foi mal interpretada
pelo governo, que tomou a fase de crescimento forte como uma conquista da sua própria
política econômica. Na verdade, a prosperidade veio de fora, com a alta dos
preços das exportações brasileiras (veja figura 4).

Figura 4 - Índice de
preços das exportações brasileiras (1980- 2012)
Aplicando
menos de 20% do PIB em investimentos (figura 5), nada foi preparado durante esta
fase de bonança para fortalecer a capacidade produtiva do país.

Figura 5 - Investimentos
em porcentagem do PIB (1980 - 2012)
O
governo brasileiro parece ser incapaz de reconhecer que uma expansão econômica
totalmente baseada no consumo, sem investimentos, é uma medida que pode
funcionar apenas no curto prazo. Para
crescer no longe prazo, é necessário haver acumulação de capital, e a
acumulação de capital requer investimentos, que, em sua vez, necessita de
poupança.
O
que possibilitou o crescimento econômico sem a concomitante expansão da base
produtiva da economia por meio de investimentos foi uma mudança radical da
tendência dos termos de troca, a
relação entre o preço dos bens de exportação e o preço dos bens de importação
do Brasil. Em termos de pontos do
índice, os termos de troca do Brasil alcançaram um máximo de 132,6 pontos em
setembro 2011, tendo atingido um mínimo 64,7 em outubro de 1981.

Figura 6
- Índice dos termos de troca (1980-2012)
Analisando
os termos de troca do Brasil — utilizando unidades constantes da moeda local —
para um período mais longo, nota-se de forma ainda mais clara a grande mudança
que aconteceu a partir de 1967.
Figura 7 - Termos de
troca em constantes unidades de moeda local (constant LCU), 1967-2012
O
forte disparo visto nos preços dos bens de exportação e a consequente melhoria
da posição do Brasil no comércio exterior coincidiu com o aumento global dos
preços das
commodities. O aumento dos preços dos bens exportados pelo
Brasil em relação aos preços dos bens importados foi consequência da alta
global dos preços das commodities. Nada
teve a ver com uma revitalização da economia brasileira.
Outro
indicador desta profunda mudança é o comércio do Brasil com a China. Preços altos e uma aceleração na demanda por
commodities da China estimularem as
exportações e, por conseguinte, o crescimento do PIB do Brasil. Segundo os dados do Ministério do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, as exportações do Brasil para a
China aumentaram de 1,9 bilhão de dólares em 2001 para 30,8 bilhões de dólares
em 2010.
Das
exportações de 2010, 83,7 % foram de commodities básicas e 11,8 % foram semimanufaturados. Somente 4,5 % foram de produtos manufaturados. Ao mesmo tempo, as importações da China para
o Brasil foram de 25,6 bilhões de dólares, sendo que 97,5 % foram produtos
manufaturados.
Uma
nova síntese se formou no mundo: o Brasil é o gigante da agricultura e dos
recursos naturais e a China é o novo gigante da indústria. Enquanto a China se industrializou, o Brasil
se enfraqueceu; e enquanto China desfrutou de altas taxas de investimentos, o
Brasil se entregou a uma mania consumista.
Crescimento sem
fundamentos
No
contexto da história econômica do Brasil, a atual debilidade da economia
brasileira não é uma grande surpresa. Mais um voo de galinha não seria uma exceção,
mas sim a regra do padrão do desenvolvimento econômico brasileiro. A liderança política do país usufrui o duvidoso
privilégio de, em decorrência da imensa riqueza do Brasil em termos de recursos
naturais e de suas benevolentes condições geográficas, quase nunca ser punida
mesmo quando comete erros graves de política econômica.
Durante
a sua história, o Brasil já vivenciou diversas crises econômicas. Mesmo durante as poucas guerras em que o país se
envolveu, o sofrimento foi pequeno em comparação ao de muitos outros países. No entanto, é esta bem-aventurança da falta de
punição imediata quando uma má política é implantada o que impede que o país viva seu
pleno potencial. A proteção contra erros
faz com que os governos brasileiros não aprendam quase nada com as trapalhadas
que cometem. Assim, a capacidade do
Brasil de efetivamente realizar o seu potencial de prosperidade é tragicamente
baixa.
Crescimento
econômico requer acumulação de capital, que por sua vez requer investimentos, sendo
que investimentos requerem poupança. Mesmo
a inovação e o aumento da qualidade do capital humano precisam de poupança. A
baixa taxa de poupança do Brasil não é um fenômeno recente, mas sim uma
característica típica da economia brasileira. Ao passo que países emergentes que estão decolando
em termos de desenvolvimento econômico apresentam taxas de poupança e de investimentos
na faixa de 30 % e 40 % do PIB, como a China, a taxa de poupança brasileira
esta abaixo de 20 %.

Figura 8 — Taxa de
poupança bruta brasileira em porcentagem do PIB, 1967- 2012
Fonte: Indicadores do
Banco Mundial. Trading Economics

Figura 9 — China. Taxa
de poupança bruta em porcentagem do PIB, 1967-2012
Fonte: Indicadores do
Banco Mundial. Trading Economics
Com
taxas de investimento tão baixas como as do Brasil, o país está destituído dos
fundamentos necessários para um progresso econômico sólido de longo prazo. O que estes débeis fundamentos permitem são apenas
pequenos booms de curto prazo, na
forma do voo de galinha — afinal, estas baixas taxas de poupança e
investimento do Brasil não são um
fenômeno recente, mas sim uma característica crônica da macroeconomia
brasileira.
Intimamente
relacionada à raquítica formação de capital — em decorrência da baixa poupança
— está a produtividade da economia brasileira. Entre 17 países da América Latina, o Brasil ocupa o 15º lugar em
produtividade; e na escala global, o país está na 75ª posição entre 122 países.
Nas décadas passadas, enquanto muitos
outros países emergentes aumentaram a produtividade de suas economias em
relação aos Estados Unidos, o Brasil perdeu em relação a eles.
A
produtividade econômica é a chave da prosperidade. O grau de produtividade representa um
determinante essencial para o nível de salários. O verdadeiro mecanismo de saída da pobreza é o
aumento da produtividade, e não a distribuição de esmolas. Para colocar o Brasil no caminho de
prosperidade não basta jogar com a macroeconomia como se ela fosse uma bola pingue-pongue.
O que o país precisa é de uma estratégia
de desenvolvimento econômico de longo prazo, direcionada para o aumento da
produtividade. Porém, isto requer
acumulação de capital e inovação — algo que é impossível de se obter sem altas
taxas de poupança e investimentos.
O que fazer para o
Brasil crescer?
A
maldição do Brasil é a abundância. Não
necessariamente a abundância na forma de recursos naturais, mas sim a
abundância excessiva de burocracia, de intervencionismo, de protecionismo, de voluntarismo
político, e até mesmo de democracia.
O
Brasil não sofre só da inflação monetária; sofre também de uma inflação de leis
e regulamentações. Não bastasse a incerteza de
se gerenciar empresas no Brasil já ser alta, esta incerteza se multiplica por causa
do intervencionismo arbitrário do governo; e se este já não fosse demasiado
agigantado, a economia brasileira também é forçada a suportar um poder judiciário
que adora se intrometer em áreas onde o livre mercado é capaz de encontrar as
melhores soluções.
Ao
mesmo tempo em que os políticos fazem o que querem com a economia e os
burocratas criam leis e regras que não fazem sentido, a super-poderosa justiça
brasileira completa a confusão com decisões que paralisam a iniciativa privada.
Em todas aquelas áreas da economia em
que os agentes necessariamente se pautam por um horizonte de tempo maior —
como poupança e investimento, infraestrutura, inovação e educação —, há uma
total paralisia. O país sofre com uma
péssima infraestrutura, o desempenho em inovação é fraco e o sistema educacional
é dos piores do mundo.
Se
de um lado o governo pratica um hiperativo intervencionismo, intrometendo-se em
áreas onde o livre mercado é mais eficiente do que qualquer burocracia, de
outro ele mostra uma generosa negligência em relação a áreas cruciais, como
infraestrutura e educação. Ainda pior do
que essa negligência é o fato de ele criar leis e regulamentações que atrapalham
e até mesmo proíbem a iniciativa privada de atuar nestas áreas.
Conclusão
Há
poucos países no mundo cujas condições são tão favoráveis para uma grande
prosperidade quanto o Brasil. Porém, uma
mentalidade favorável ao intervencionismo estatal e burocrático produz uma atitude de
procrastinação permanente que atravessa todo o espectro da sociedade
brasileira. O Brasil parece aquele
sujeito que tem uma casa grande e bela, mas com vários buracos no telhado que
precisam ser reparados. Quando o tempo
está bom, ele acha que não há necessidade de consertar os buracos; e quando
chove, ele diz que não pode fazer nada agora porque o tempo está ruim.
A
principal causa da paralisia do país perante a urgente necessidade de se arrumar as
condições para possibilitar um futuro melhor é a onipresença do estado
brasileiro. Este estado intervencionista
obstrui todas as atividades privadas. A
economia brasileira se encontra permanentemente bombardeada por
imprevisibilidades e por uma total ausência de lógica e de bom senso nas
medidas intervencionistas do governo, as quais visam apenas ao curtíssimo
prazo. O resultado é uma economia de
produtividade extremamente baixa em conjunto com uma renda não somente baixa,
mas também mal distribuída.
O
que bloqueia o país não é a falta de "inclusão social" ou outras quimeras. O que bloqueia o progresso do Brasil é a
crença quase absoluta no poder do estado e uma forte desconfiança na eficiência
do livre mercado. O grande mistério da
cultura brasileira é a contradição entre esta ideologia que idolatra o estado
e a visível realidade gerada por esta ideologia.
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